sexta-feira, 9 de julho de 2010

O Milagre da Vida.

Como experimentar o milagre da vida
 
Alegria e felicidade nascem da concentração. Quando você está bebendo uma xícara da chá, o valor dessa experiência depende de sua concentração. Você tem que beber sua xícara de chá com 100% de seu ser. O verdadeiro prazer é experimentado na concentração. Quando você anda e está 100% concentrado, a alegria que obtém dos passos que está dando é muito maior que a alegria que teria sem concentração. Você tem que investir 100% de seu corpo e mente no ato de andar. Então experimentará que estar vivo e dar passos neste planeta são coisas maravilhosas.
 
O mestre Zen Linji (também conhecido como Rinzai) disse: “Milagre é andar na Terra, não andar sobre a água ou fogo. O milagre real é andar sobre a Terra.” Porque você não deveria realizar um milagre apenas andando? Um passo dado com plena atenção pode te levar ao Reino de Deus. Isto é possível. Você pode fazer isso hoje. A vida é muito preciosa para nos perdermos em idéias e conceitos, na nossa raiva e no nosso desespero. Devemos acordar para a realidade maravilhosa da vida. Devemos começar a viver plenamente e verdadeiramente, cada momento de nossas vidas diárias.
 
Quando você está segurando uma xícara de chá na sua mão, faça isto enquanto fica 100% presente. Você sabe como fazer isso – uma profunda inspiração, uma gentil expiração e o corpo e mente ficam juntos. Você está realmente presente, absolutamente vivo, plenamente presente! Isto apenas leva dez ou quinze segundos, e de repente o chá se revela para você em todo seu esplendor e maravilha.
 
Quando eu pego um livro ou abro a porta, quero investir 100% de mim mesmo neste ato. Isto foi o que aprendi durante meu treinamento monástico, quando meu professor me ensinou como oferecer um incenso. Um bastão de incenso é muito pequeno e muito leve, ainda assim a maneira correta de segura-lo é com as duas mãos. Quando oferecer um incenso, você deveria investir 100% de seu ser nas suas mãos e em dois de seus dedos – a energia da plena atenção deve estar concentrada lá. Isto pode parecer como um ritual, mas é na realidade um ato de atenção concentrada. Eu coloco minha mão esquerda sobre a minha mão direita, e durante esse tempo me concentro 100%. O incenso é uma oferenda ao Buda, mas o Buda de fato precisa de incenso? Na verdade é uma oferenda de paz, de alegria e de concentração.
 
Durante meu primeiro ano de treinamento no templo, meu professor me pediu para fazer um favor para ele. Eu o amava tanto que fiquei muito excitado e corri para fazer. Eu estava com tanta pressa que não deixei a sala como deveria. Eu não fechei a porta apropriadamente, com 100% de meu ser.
 
Ele me chamou de volta. “Noviço,” ele disse, “venha aqui.” Eu soube imediatamente que havia algo de errado. Ele disse apenas, “Meu filho, você pode fazer melhor.” Ele não teve que me ensinar uma segunda vez. Na vez seguinte, eu fiz meditação caminhando até a porta, abri em plena consciência e fechei a porta atrás de mim perfeitamente.
 
Desde esse dia, eu sei como fechar uma porta. Eu tenho sempre feito isso com plena atenção – não pelo Buda, nem pelo professor, mas por mim mesmo. Esta é a maneira que você cria a paz; esta é a maneira que você traz liberdade. Você faz pela sua própria felicidade, e quando estiver feliz, as pessoas com as quais você se relaciona se beneficiarão da sua presença e ficarão felizes também. Uma pessoa feliz é uma coisa importante, porque a felicidade se espalha ao seu redor. Você pode também ser uma pessoa feliz e se tornar um refúgio para todos os seres próximos.
 
Concentração é a prática da felicidade. Não há felicidade sem concentração. Quando você comer uma laranja, tente praticar a concentração. Coma de tal modo que prazer, alegria e felicidade sejam possíveis o tempo todo. Você poderia chamar isto de meditação da laranja.  Você pega a laranja na palma da mão. Você olha para ela e respira de tal modo que ela se revele como o milagre que é. Uma laranja não é nada menos que um milagre. É como você – você também é um milagre. Você é um milagre manifestado.
 
Se eu estou 100% presente, a laranja se revela para mim 100%. Ao me concentrar na laranja, tenho insights profundos dela. Eu posso ver o sol e a chuva que estão nela. Posso ver as flores da laranjeira. Posso ver o pequeno broto e depois a fruta crescendo. Então eu começo conscientemente a descascar a fruta. Sua presença, sua cor, sua textura, seu cheiro e gosto – é um milagre real, a felicidade que vem para mim ao entrar profundamente em contato com a laranja se torna muito, muito grande. Uma simples laranja é suficiente para te dar uma grande porção de felicidade quando você está verdadeiramente presente, inteiramente vivo em profundo contato com um dos milagres da vida que estão ao seu redor.
 
Aos poucos você deve se treinar para viver, para ser feliz. Você provavelmente recebeu um diploma universitário para o qual você trabalhou por anos, e você pensou que a felicidade seria possível depois de obtê-lo. Mas isso não era verdade porque depois de obter esse diploma e achar um emprego, você continuou a sofrer. Você tem que perceber que a felicidade não é algo que você acha no final do caminho. Tem que entender que ela está aqui, agora. A prática da plena consciência não é uma fuga ou uma alienação. Significa entrar vigorosamente na vida com a força gerada pela energia de plena consciência. Sem esta liberdade e concentração, não há felicidade.
 
Budismo engajado significa engajamento não apenas na ação social mas na vida diária. O objeto desta prática é alegria da vida diária, o que é liberdade. Deveríamos usar nosso tempo com muita inteligência, porque tempo não é apenas dinheiro; é muito mais precioso que isso. É vida. Um dia tem 24 horas; você sabe como gerenciar esse dia? Você é inteligente e tem muitos talentos diferentes, mas sabe como administrar os seus dias? Você deveria investir 100% em organizar os dias que te são dados para viver. Você pode fazer isso.
 
Com a prática da plena consciência, transformar sua dor se tornará muito mais fácil. Alegria e felicidade te ajudarão a ter novamente equilíbrio e curar a sua dor.
 
Você sabe que a boa circulação do sangue é necessária para o bem estar de seu corpo. O mesmo é verdade para sua mente: você deve viver e praticar de tal forma que sua consciência se beneficie da boa circulação. A má circulação dos elementos psicológicos cria problemas. Blocos de sofrimento, medo, ciúme e stress estão presos nas profundezas da consciência. Eles não podem circular e eles te fazem sentir medo. É por isso que você fechou a porta da sua consciência armazenadora, porque você não quer que essas coisas venham para a superfície. Você tem medo da dor dentro de você e, portanto quando há um espaço no seu dia você o preenche com livros ou televisão de forma que esses blocos de sofrimento não possam vir para a superfície.
 
Isto é o que a maioria de nós faz. É uma política de embargo. Você faz o melhor que pode para esquecer o que tem por dentro e consumir o que quer que esteja disponível para ajudá-lo. Desta maneira você cria uma má circulação psicológica e os problemas mentais logo vão aparecer. Enquanto você está dormindo, o acúmulo de sofrimento irá se revelar sozinho nos seus sonhos. Eles irão implorar por ajuda, mas você continua a praticar a supressão e a repressão. Depressão, medo e confusão podem também se manifestar no reino do soma, no corpo. Você terá dores de cabeça e todos os tipos de outras dores, mas seu médico não será capaz de identificar a fonte porque ela tem natureza psicológica.
 
O budismo ensina que o corpo e mente são dois aspectos da mesma coisa. Não há dualidade entre os aspectos físicos e mentais. Há uma expressão em sânscrito, namarupa. Nama é o nosso aspecto mental e rupa significa forma. Não podemos distinguir entre o físico e o mental. Sua mão não é apenas uma formação física, é uma formação mental ao mesmo tempo. As células de seu corpo não são apenas físicas, também são mentais. Elas são ambas ao mesmo tempo.
 
O budismo descobriu que a realidade às vezes se manifesta como psique e às vezes como soma. Psicossomático é o termo ocidental; namarupa é o equivalente em sânscrito. Deveríamos nos treinar a ver as coisas “físicas” não apenas como físicas. Na verdade, “físico” e “mental” não são mais do que expressões.
 
O Manifesto Humanista que foi assinado em 1933 diz que a dualidade mente-corpo deveria ser rejeitada, incluindo-se a idéia de uma alma que sobrevive depois da morte, porque ela também representa uma dualidade. O que o budismo diz sobre isso? O budismo concorda que a dualidade mente-corpo deve ser rejeitada, mas não diz que a desintegração do corpo representa uma negação total. O budismo nos ajuda a ver que nem o conceito de permanência nem o conceito de aniquilação se aplicam à realidade.

Estudos Budistas
Tradição do Ven. Thich Nhat Hanh

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Tornando-se nada

Tornando-se Nada
Nosso maior medo é que ao morrermos nos tornaremos nada. Muitos acreditam que toda a nossa existência é somente a vida que começa no momento em que nascemos e que termina no momento da nossa morte. Acreditamos que nascemos a partir do nada e que quando morrermos nos tornaremos nada. E por isso ficamos cheios medo da aniquilação.

O Buda tem uma compreensão muito diferente de nossa existência. Para ele, nascimento e morte são noções, não são a realidade. O fato de que pensemos que são realidade produz uma ilusão muito poderosa que faz com que soframos. O Buda ensinou que não existe nem nascimento e nem morte, nem ir e nem vir, nem o mesmo e nem diferente, nem um eu permanente e nem aniquilação. Somos nós que pensamos assim. Ao compreendermos que não podemos ser destruídos, a gente se liberta desse medo e isso é um grande alívio. Passamos a aproveitar melhor a vida e a apreciá-la de uma nova maneira.

ORDEM DO INTERSER (THICH NHAT HANH)

Alguns dos Treinamentos da Ordem do Interser:

Primeiro Treinamento
Consciente do sofrimento causado pelo fanatismo e pela intolerância estou determinado a não idolatrar ou me apegar a doutrinas, teorias ou ideologias, mesmo o budismo.
Os ensinamentos budistas são princípios que me ajudam a aprender como observar profundamente e como desenvolver minha compreensão e minha solidariedade. Eles não são doutrinas pelas quais se deva lutar, matar ou morrer.

Segundo Treinamento
Consciente do sofrimento causado pelo apego a conceitos e percepções errôneas, estou determinado a não possuir uma mente limitada e amarrada às idéias atuais.
Aprenderei e praticarei o desapego a pontos de vista a fim de estar aberto a outras compreensões e experiências. Estou consciente de que o conhecimento que possuo não é imutável e não constitui verdade absoluta. A verdade é encontrada na vida e a observarei tanto no meu interior como ao redor de mim, em cada momento, pronto a aprender através de toda a minha vida.

Terceiro Treinamento
Consciente do sofrimento causado quando imponho meus pontos de vista aos outros, comprometo-me a não forçar ninguém, nem mesmo os meus filhos, por quaisquer que sejam os meios, tais como: autoridade, ameaça, dinheiro, propaganda ou doutrinação, a adotar os meus pontos de vista.
Respeitarei o direito das pessoas de serem diferentes e de escolherem no que acreditar e os meios pelas quais decidirão. Contudo, ajudarei a renunciarem ao fanatismo e à estreiteza através de um diálogo compassivo.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

A Onda e a Água.

A onda e a água.

Um exemplo que nós utilizamos frequentemente no budismo é o da onda e da água. A onda surge do oceano e quando você observa o fenômeno da onda, você vê que existe um começo e um fim. Você vê o subir e o descer, você vê a presença e a ausência da onda. Antes de subir parece que a onda não existia, e depois dela ter descido também não a vemos existindo. Fazemos distinções entre uma onda e outra onda. Uma onda pode ser mais bonita, mais alta, mais baixa do que a outra onda. Então, no que diz respeito ao mundo dos fenômenos, temos todos os tipos de conceitos: começo, fim; alto, baixo; mais bonito e menos bonito; e isso cria muito sofrimento. Mas ao mesmo tempo sabemos que a onda também é água. É possível para uma onda viver a vida dela como uma onda e como água simultaneamente. Enquanto onda, ela pertence ao mundo dos fenômenos: ela tem um início, um fim, uma subida, uma descida. Ela se distingue das outras ondas. Mas se ela tiver tempo de sentar e tocar profundamente sua própria natureza, ela compreenderá que é água. Ela não é somente uma onda, ela também é água. No momento em que ela compreende que é água, ela deixa de sofrer completamente. Ela não mais teme subir e descer. Ela deixa de ficar preocupada em existir ou inexistir. Água representa o mundo noumenalNT, o mundo sem nascimento e sem morte, sem chegada, sem partida.
Se você vai um pouco mais fundo, vê que o que fazemos juntos, falamos juntos, pensamos juntos, terá um efeito sobre nós e sobre o mundo, agora e posteriormente. No ensinamento budista, nada é estritamente individual e nada é estritamente coletivo. Estas noções são relativas.
Você poderia pensar que o seu corpo é uma posse individual sua, mas o seu corpo também pertence ao mundo. Suponha que você é um motorista e sua segurança depende dos seus nervos óticos. Você pensa em seus nervos óticos como algo estritamente individual; eles lhe pertencem e você é a pessoa que se beneficia deles e é responsável por eles. Mas se você é um motorista de ônibus, todos nós que sentamos no seu ônibus confiamos muitíssimo nos seus nervos óticos. Nossas vidas dependem de você. Por isso, dizer “Esta é a minha própria vida!” é um pouco ingênuo. Nós estamos em você e você está em nós. Nós interexistimos.
Vendo uma flor, nós a identificamos como uma rosa branca, e estamos muito certos de que esta é uma realidade objetiva que existe separadamente da nossa consciência – quer estejamos pensando na flor ou não, ela está ali. Ela pertence à realidade objetiva externa. Temos a tendência de pensar desta maneira. Mas nós aprendemos com a ciência que as cores que percebemos é uma matéria da vibração de uma onda de luz particular. Se o comprimento da onda for demasiadamente curto ou demasiadamente longo nós não a percebemos. Quando as freqüências são apropriadas aos órgãos dos nossos sentidos nós acreditamos que àquelas coisas existem. Mas quando não percebemos a freqüência, pensamos que elas inexistem. Eu posso perguntar a outro ser humano: “Você ve a mesma coisa que eu vejo? Você ouve o que eu ouço?” E a pessoa responde: “Sim, eu vejo o que você vê, eu ouço sim o que você ouve.” Então você tem a impressão, como nós dois concordamos com aquilo, que aquilo deve ser daquela forma, e que é algo objetivo e externo. Mas esquecemos do fato de que nós seres humanos somos constituídos de modo semelhante. Nossos órgãos dos sentidos são constituídos de modo semelhante. Todos nós concordamos que isto é uma mesa; nós a chamamos “mesa”. Nós somos da mesma opinião que ela é um suporte para nós escrevermos sobre ela. Porque somos seres humanos temos a tendência de olhar para esta mesa, como um instrumento. Mas se tivéssemos nascido cupins, olharíamos para a mesa de modo diferente. Nós poderíamos vê-la como uma fonte de comida, suculenta, saborosa e nutritiva. Os cupins são construídos de tal modo que a mesa se torna alimento; nós somos construídos de tal modo que a mesa é um suporte para nossa escrita e leitura.
É por isso que o que acreditamos ser uma realidade exterior pode ser apenas uma construção mental. Como os nossos órgãos dos sentidos estão construídos de um modo tal, recebemos o que se chama de mundo objetivo de determinada forma, e acreditamos ser este uma realidade objetiva. Nós sabemos que a rosa é uma construção mental coletiva de um grupo de seres vivos chamados humanos. Isto é participação no reino do ser. As abelhas têm o seu reino de existência, os pássaros têm o seu reino de existência, os humanos têm o seu reino de existência; e este reino de existência é uma manifestação coletiva, uma concepção coletiva do carma deles, da consciência deles, da consciência armazenadora deles.
No ensinamento budista, uma vez que a mente não é localizável, ela não pode morrer, ela só pode se transformar. Você continua no meio ambiente. A consciência armazenadora, os seus pensamentos, a sua fala e as suas ações fazem surgir o fruto do carma, que é composto de você e do seu meio ambiente. Você e o seu meio ambiente são um e criam o seu carma. Podemos assegurar um belo futuro tomando conta dos nossos pensamentos, da nossa fala e das nossas ações. Você tem o poder de se mudar por dentro, e você tem o poder de mudar você mudando o seu meio ambiente. Cuidar de você significa cuidar do seu corpo e cuidar do seu meio ambiente. Não é verdade que os genes determinam tudo. Ao produzir os seus pensamentos, falas e ações você cria o seu meio ambiente. Você sempre tem a oportunidade de se organizar e organizar o seu meio ambiente de modo a aguar as sementes positivas dentro de si. Este é o segredo da felicidade.
É claro que nosso ambiente não está construído somente das coisas que vemos a nossa volta. Existem coisas que nós não vemos ou ouvimos. E tendemos a descrevê-las como inexistentes. Suponha que olhamos para o espaço em uma grande sala de meditação. O espaço a nossa volta está cheio de sinais de televisão, rádio e celulares que não conseguimos ver ou ouvir. Nós precisamos do mecanismo – o telefone celular ou televisão – para traduzir estes sinais para nós. O que freqüentemente descrevemos como vacuidade está realmente bem cheio. É a nossa consciência mental que traduz todas estas coisas em sons e cores. Portanto eu não tenho certeza se a folha que eu segurava estava dentro ou fora da minha mente. Nós temos que ser humildes e abertos para permitir que a verdade penetre. O segredo do budismo é remover todas as idéias, todos os conceitos, para que a verdade tenha chance de penetrar e se revelar.

NT No que diz respeito aos possíveis significados deste termo, podemos observar que “noumena, ou seres em si mesmos; (em Alemão Dinge-na-sich) é um termo usado por Kant com referência às coisas subjacentes a nossa experiência tanto do mundo físico como dos nossos próprios estados mentais (chamado por ele de fenômenos do sentido externo e interno) e que não são eles mesmos objetos de experiência possível” (The Fontana Dictionary of Modern Thought; 1988, Londres, Fontana Press, segunda edição, editores: Bullock, Stallybrass e Trombley).
Do livro Buddha Mind, Buddha Body: Walking toward Enlightenment, de Thich Nhat Hanh)
Tradução para o português: Tâm Vân Lang
www.viverconsciente.com

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Achando a própria mente.

Achando a própria mente

Quando estamos estressados com alguma coisa, ou muito ocupados, dizemos freqüentemente que estamos “perdendo a cabeça” [i.e, a mente]. Mas onde a sua mente estava antes de se perder e para onde ela teria ido? No Sutra Surangama um texto budista popular no Vietnã e China, Buda e seu discípulo Ananda discutem como localizar a mente. Ela está dentro do corpo, fora do corpo ou entre o corpo e o mundo exterior? Em última instância, o sutra nos ensina que a mente não é localizável. Em outras palavras, você não pode dizer que ela está dentro do corpo, fora do corpo, ou entre eles. A mente não tem um local estabelecido.
Não só a mente é não-localizável, tudo é assim. Hoje de manhã eu peguei uma tenra folha verde solta no chão. Esta folha está em minha mente ou fora dela? Que pergunta! É uma pergunta muito simples, mas muito difícil de ser respondida. A noção de fora e dentro não pode ser aplicada a realidade.
Nós temos a tendência de pensar na mente como “aqui dentro” e no mundo como “lá fora”, a mente como subjetiva e o mundo, o corpo, como objetivo. Buda ensinou que mente e objeto da mente não existem separadamente, eles interexistem. Sem este, o outro não pode ser. Não há observador sem o observado. Objeto e sujeito se manifestam juntos. Geralmente quando pensamos em mente, pensamos somente em consciência mental. Mas mente não é apenas consciência mental, ela também é manas, ela também é consciência armazenadora.
Podemos nos treinar para ver o nosso corpo como um rio, e a nossa mente como parte daquele mesmo rio, sempre fluindo, sempre mudando. De acordo com a psicologia budista, o maior dos obstáculos à nossa habilidade de ver a realidade claramente é a nossa tendência de ficar muito envolvido na noção do sujeito ser algo diferente do objeto, e objeto ser algo independente do sujeito. Este modo de olhar se tornou um hábito, um padrão influenciador do nosso pensamento e comportamento.
Quando eu era um jovem noviço, nós estudávamos que a consciência possui três partes. A primeira e a segunda partes são: darshana, o observador, e nimita, o observado – isto é, o sujeito e o objeto. Sujeito e objeto se apóiam um no outro para se manifestar. Se você acredita que sujeito pode existir sem objeto, este é o maior dos erros. Temos a tendência de acreditar que o sujeito de cognição, a nossa mente, é algo que pode existir separadamente e independentemente do objeto de cognição, ou objeto da experiência. E nós acreditamos que o objeto de cognição, o que está lá fora, é algo que existe separado do sujeito de cognição.
No budismo existe o termo namarupa.* Namarupa é equivalente ao psicossomático. A realidade se manifesta em duplo aspecto: psique e soma; o mental e o biológico. E um não pode existir sem o outro. Cérebro e mente são dois aspectos da manifestação de uma coisa. Então, nós temos que nos treinar para ver o cérebro como a consciência e a não ver a consciência como algo totalmente separado e diferente do cérebro.
Quando você convida a chama a se manifestar, você pode pensar que a chama é algo totalmente diferente do fósforo. Mas você sabe que a chama é imanente, está escondida no combustível da cabeça do fósforo, está escondida no oxigênio do ar, a chama não tem localidade real. E quando as condições se reúnem, a chama se manifesta. A natureza da consciência também não é localizável. Sabemos que consciência é sempre consciência de algo. Objeto e sujeito estão sempre juntos. Olhando dentro desta parte, você vê a outra parte. Olhando dentro da outra parte, você ver esta parte. Esta é a natureza da interexistência. Um está dentro do outro.

Nama em sânscrito significa “mente”, e “rupa” significa “corpo”.

Sangha Virtual
Estudos Budistas
Tradição do Ven. Thich Nhat Hanh

Mestre Zen Thich Nhat Hanh já foi indicado ao prêmio Nobel da Paz.

http://www.pazacadapasso.org/
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